domingo, 22 de novembro de 2009


Tati, a garota
Nana Caymmi
Composição: Dori Caymmi / Paulo Cesar Pinheiro

Era uma criança tão singela
Só que Deus pôs dentro dela
Um mistério da tristeza

Era inocente
Sem saber que a dor que sente
Era herança de uma dor maior
Com esse olhar tão só

Caminha essa criança tão sozinha
Numa estrada que não volta
Nunca mais

Ah, se eu pudesse fazer
Você jamais crescer
Eu ia cuidar de você

Qual nada
É uma criança já marcada
À mercê de triste herança
Solidão, dor e distância
Prá viver a infância como nunca mais

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

"Inclemência"

Compositor: Desconhecido

"Pensei que haveria um pouco mais de amor para mim.
Guardei cada luar, cada verso encoberto nas notas da canção.
Pra quê? Se um vazio me esperava, eu não percebi...
Devolve meus dias, minha alegria.
Diz nos meus olhos verdades ruins.

Pensei que haveria um pouco mais de amor para mim.
Guardei cada luar cada verso encoberto nas notas da canção.
Pra quê? Se um vazio me esperava, eu não percebi...
Devolve meus dias, minha alegria.
Diz nos meus olhos verdades ruins.

Que não foi bom rimar cada carinho que eu fiz.
Que a minha voz cantada nem soa tão bem.
Que o nossos sonhos foram pesadelos enfim,
mas pelo menos fala pra mim

Esse silêncio é que me atordoa.
Se foi tudo à toa, volta e me deixa.
Me recolho e volto ao meu mundo.
Porque é só meu, tem que voltar pra mim.

Me lembro quando você passou
era um dia tão claro de Sol.
Pensei, meu Deus, é um sonho.
Meu coração feito um louco batuque.

Por isso agora não me machuque,
vou te guardar como triste lembrança.
Ninguém jamais vai me enganar outra vez.
Eu prometo à vocês.

Me lembro quando você passou
era um dia tão claro de Sol.
Pensei, meu Deus, é um sonho.
Meu coração feito um louco batuque.

Por isso agora não me machuque,
vou te guardar como triste lembrança.
Ninguém jamais vai me enganar outra vez.
Eu prometo à vocês.

Pensei que haveria um pouco mais de amor para mim.
Guardei cada luar, cada verso encoberto nas notas da canção.
Pra quê? Se um vazio me esperava, eu não percebi...
Devolve meus dias, minha alegria.
Diz nos meus olhos verdades ruins."

"não, eu não me apaixonei por ele. eu me apaixonei pela idéia de viver." ("Shirley Valentine")

sexta-feira, 31 de julho de 2009

"Listen"

Composição: Anne Preven / Beyoncé Knowles / Henry Krieger / Scott Cutler


Listen to the song here in my heart
A melody I start but can't complete
Listen to the sound from deep within
It's only beginning to find release

Oh, the time has come for my dreams to be heard
They will not be pushed aside and turned
Into your own all 'cause you won't
Listen

Listen, I am alone at a crossroads
I'm not at home in my own home
And I've tried and tried to say what's on mind
You should have known

Oh, now I'm done believing you
You don't know what I'm feeling
I'm more than what you made of me
I followed the voice you gave to me
But now I've gotta find my own

You should have listened, there is someone here inside
Someone I thought had died so long ago
Oh, I'm screaming out and my dreams'll be heard
They will not be pushed aside on words
Into your own all 'cause you won't
Listen

Listen, I am alone at a crossroads
I'm not at home in my own home
And I've tried and tried to say what's on mind
You should have known

Oh, now I'm done believing you
You don't know what I'm feeling
I'm more than what you made of me
I followed the voice you gave to me
But now I've gotta find my own

I don't know where I belong
But I'll be moving on
If you don't, if you won't

Listen to the song here in my heart
A melody I start but I will complete

Oh, now I'm done believing you
You don't know what I'm feeling
I'm more than what you made of me
I followed the voice you think you gave to me
But now I've gotta find my own, my own

terça-feira, 28 de julho de 2009

"Pra machucar meu coração"
(Ary Barroso)
"Ta fazendo um ano e meio amor
Que o nosso lar desmoronou
Meu sabia
Meu violão
E uma cruel desilusão
Foi tudo que ficou, ficou
Pra machucar meu coração

Quem sabe não foi bem melhor assim
Melhor pra você
E melhor pra mim
A vida é uma escola
Onde a gente precisa aprender
A ciência de viver pra não sofrer"

"e eu fiquei desejando que ele chegasse logo... que me desse aquele sorriso que é a cara dele... e me abrisse os braços pra eu me afogar no abraço...
mas não foi...
ele chegou... deu bom dia... trocou de roupa e foi deitar..."




sem ponto de referência nessa cidade...

segunda-feira, 27 de julho de 2009

"Trajetória"

Maria Rita

Composição: Arlindo Cruz / Serginho Meriti / Franco

"Não perca tempo assim contando história
Pra que forçar tanto a memória
Pra dizer
Que a triste hora do fim se faz notória
E continuar a trajetória
É retroceder
Não há no mundo lei que possa condenar
Alguém que a um outro alguém deixou de amar
Eu já me preparei, parei para pensar
E vi que é bem melhor não perguntar
Porque é que tem que ser assim
Ninguém jamais pôde mudar
Recebe menos quem mais tem pra dar
E agora queira dar licença, que eu já vou
Deixa assim, por favor
Não ligue se acaso o meu pranto rolar, tudo bem
Me deseje só felicidade, vamos manter a amizade
Mas não me queira só por pena
Nem me crie mais problemas
Nem perca tempo assim contando história..."

terça-feira, 14 de julho de 2009

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o tejo não é o rio que corre pela minha aldeia,
O Tejo tem grande navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.
Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.
O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

(Fernando Pessoa)

quinta-feira, 2 de julho de 2009

The man I love
Composição: George Gershwin/Ira Gershwin

Someday he'll come along
The man I love

And he'll be big and strong
The man I love
And when he comes my way
I'll do my best
To make him stay

He'll look at me and smile
I'll understand
And in a little while
He'll take my hand
And though it seems absurd
I know we both
Won't say a word

Maybe
I shall meet him Sunday
Maybe monday, maybe not
Still I'm sure
To meet him one day
Maybe Tuesday
Will be my good news day

He'll build a little home
Just meant for two
From which I'd never roam
Who would, would you?
And so all else above
I'm wating
For the man I love

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Ate breve.

Despedida e chuva.

sábado, 20 de junho de 2009

Eu quero ser possuída por você
José Vicente

Eu quero ser possuída por você
Pelo seu corpo,
pela sua proteção,
pelo seu sangue.
Me ama.
Eu quero que você me ame
E fique eternamente me amando dentro de mim,
Com sua carne e o seu amor,
Eternamente, infinitamente dentro de mim
Me envolvendo, me decifrando
Me consumindo, me revelando.
Como em uma tarde dentro do elevador,
No verão, voltando da praia
Você me abraçou e eu te abracei
E quanto mais eu me entregava
Mais nascia o meu desejo,
Mais sobrava só o desejo.
E mais eu te queria sem palavras,
sem pensamentos.
A vida inteira resumida só no desejo
Da tua boca dizendo meu nome
Da tua mão conduzindo a minha mão
Do teu corpo revelando o meu corpo...
Como se o mundo fosse pela primeira vez.
Você, meu ponto de referência nessa cidade.

sábado, 6 de junho de 2009

Djavan - Melodia Sentimental



"Melodia sentimental"
Composição: Heitor Villa Lobos e Dora Vasconcelos

Acorda, vem ver a lua
que dorme na noite escura
que surge tão bela e branca
derramando doçura
clara chama silente
ardendo meu sonhar
As asas da noite que surgem
e correm o espaço profundo
oh, doce amada, desperta
vem dar teu calor ao luar
Quisera saber-te minha
na hora serena e calma
a sombra confia ao vento
o limite da espera
quando dentro da noite
reclama o teu amor
Acorda, vem olhar a lua
que brilha na noite escura
querida, és linda e meiga
sentir meu amor e sonhar

domingo, 31 de maio de 2009

http://www.youtube.com/watch?v=fxsyffIBJ0I
*Alessandra Maestrini n"A ópera do malandro"

"Palavra de mulher"

Composição: Chico Buarque

Vou voltar
Haja o que houver, eu vou voltar
Já te deixei jurando nunca mais olhar para trás
Palavra de mulher, eu vou voltar
Posso até
Sair de bar em bar, falar besteira
E me enganar
Com qualquer um deitar
A noite inteira
Eu vou te amar

Vou chegar
A qualquer hora ao meu lugar
E se uma outra pretendia um dia te roubar
Dispensa essa vadia
Eu vou voltar
Vou subir
A nossa escada, a escada, a escada, a escada
Meu amor eu, vou partir
De novo e sempre, feito viciada
Eu vou voltar

Pode ser
Que a nossa história
Seja mais uma quimera
E pode o nosso teto, a Lapa, o Rio desabar
Pode ser
Que passe o nosso tempo
Como qualquer primavera
Espera
Me espera
Eu vou voltar

domingo, 17 de maio de 2009

Céu estrelado. Silêncio. Só uns grilos e um galo longe. Frio.

"(Zacarias está tocando violão. Uma mulher da vida aproxima-se dele. Não é feia. Fica parada, olhando o negro que toca)
Zacarias: "Quando o apito da fábrica de tecidos vem ferir os meus ouvidos, eu me lembro de você..."
(Zacarias para de tocar quando vê a moça)
Alice: Bonito. Toca mais.
Zacarias:Eu gosto de tocar. Mas mãe sempre dizia que nêgo é pra trabalhar.
Alice: Você sabe aquela:
"Até nas flores se encontra
A diferença de sorte:
Umas enfeitam a vida.
Outras enfeitam a morte."
(Alice suspira)
Na vida é desse jeito mesmo. Tem gente que não tem sorte. Eu mesma. Mas que fazer? Se tivesse quem trabalhasse pra mim, eu deixava essa vida. Mas vivo sozinha: eu e Deus. Nunca deixei de acreditar. Nunca deixei de rezar.
Zacarias: Mãe também rezava.
Alice: Sua mãe morreu, não foi?
Zacarias: Foi.
Alice: Você já viu o mar? (Zacarias acena com a cabeça que não) Eu já vi. Levei até flores pra Iemanjá.
Zacarias: Iemanjá?
Alice: É. A rainha do mar. Ela vive num palácio no fundo das águas com o seu príncipe encantado. (Zacarias está pensativo) As estrelas são bonitas, não são?
Zacarias: São.
Alice: Sabia que cada uma dessas estrelas é a alma de um valente, de uma moça donzela que não conheceu homem, de um santo que foi pro céu?
Zacarias: Quer dizer que tem estrela macho e estrela fêmea?
Alice: Não é assim, que tudo vira estrela. Estrela não é gente, não. Estrela não tem corpo.
Zacarias: Complicado, hein?
Alice: Não. O corpo fica na terra, a terra não come? Pois só a alma vira estrela.
Zacarias: Será que mãe virou estrela também?
Alice: Ainda não. Demora, tem que ser julgada por Deus.
Zacarias: Mas o padre disse que Deus já perdoou mãe faz tempo.
Alice: Então ela virará estrela, com certeza.
(Alice está bem perto de Zacarias. Ele arrasta a mulher para a cama)
Zacarias: Como você se chama?
Alice: Alice.
Zacarias: Bonito."

(dois cigarros)
sequei. ou tá tudo tão escondido que perdi...

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Amplidão
Elba Ramalho
Composição: Chico César

Deixa eu te guardar, a casa é sua
Faz em mim teu lar, me reconstrua
Queira me habitar onde eu me escondo
Faz deste lugar só seu no mundo

Eu quero ser onde você sossega a alma
E chora e ri
E encontra a calma pra sonhar, sem dormir
Vem acender as luzes que iluminam o meu coração
Vem ter comigo sua parte da amplidão
De minha parte, eu estou aqui...

terça-feira, 5 de maio de 2009

(do orkut) Sorte de hoje: Viver amanhã é muito tarde. Viva hoje

domingo, 3 de maio de 2009

má-drugada

madrugada
trabalho
sem óculos. distorcido. manchado
pastel. capuccino. cigarro
sabonete. pigarro
solidão. cabeça à mil. cabeça vazia
preciso rever a minha vida. não sei o que mudar
inconstante. cabeça cheia. cabeça vazia
não sei o que preciso mudar
ando dormindo demais. café
frio. chuva chegando
amigos. feriado. noites. beijos
alguma (bastante) felicidade
depois isso
Deus. não estou sendo bom
eu estava feliz. até que o sono voltou
compromissos largados. projetos atrasados
preciso me acalmar
cabeça precisa parar de ter tantas coisas e ser tão rápida
dor de cabeça
desejo. solidão
vou ficar acordado e a segunda-feira vai ser demorada
fazer a barba. corretivo. pó
ninguém pra conversar. conversas não ajudariam
Deus. preciso rezar
não quero ouvir música
capuccino. palavras soltas
poemas. dança. luz
tanta coisa junta e o vazio tão grande
desejos de outros, de paz, de mudança. incapacidade. estático
parado, pateta, ridículo
será que ainda acredito em alguma coisa
vontade de mar. vontade de rua. de madrugada sem rumo na rua
o dia amanhece já
será que vai dar tempo
será que vou ter salvação
capuccino
sobraram dois cigarros pra outras madrugadas

domingo, 29 de março de 2009

"Dois meninos"
Maysa
Composição: indisponível

Como dois meninos
que se entendem sem falar.
Como dois meninos
fizemos de tudo o amor.

Como dois meninos
fugimos de tudo um dia.
Fizemos tudo um dia
e ficamos sem saber.

Como dois meninos
nós brigamos por tolices
entendemos a saudade.

Nunca mais, nós dois seremos
como dois meninos.

sábado, 28 de fevereiro de 2009

"(...) A l'heure où naît un jour nouveau
Je rentre retrouver mon lot de solitude.
J'ôte mes cils et mes cheveux
Comme un pauvre clown malheureux de lassitude.
Je me couche mais ne dors pas
Je pense à mes amours sans joie si dérisoires.
A ce garçon beau comme un Dieu
Qui sans rien faire a mis le feu à ma mémoire. (...)"


("Comme ils disent", de Charles Aznavour)

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

"Ternura antiga"
Composição: Dolores Duran e J. Ribamar

Ai, a rua escura, o vento frio
Esta saudade, este vazio
Esta vontade de chorar
Ai, tua distância tão amiga
Esta ternura tão antiga
E o desencanto de esperar
Sim, eu não te amo porque quero
Ah, se eu pudesse esqueceria
Vivo, e vivo só porque te espero
Ai, esta amargura, esta agonia

"Serenata do adeus"
Composição: Vinicius de Moraes

Ai, a lua que no céu surgiu
Não é a mesma que te viu
Nascer nos braços meus
Cai, a noite sobre o nosso amor
E agora só restou do amor
Uma palavra : Adeus

Ai, vontade de ficar mas tendo que ir embora
Ai, que amar é se ir morrendo pela vida afora
É refletir na lágrima um momento breve
De uma estrela pura cuja luz morreu

Ai, mulher, estrela a refulgir
Parte, mas antes de partir
Rasga meu coração
Crava as garras no meu peito em dor
E esvai em sangue todo o amor
Toda desilusão

Ai, vontade de ficar mas tendo que ir embora
Ai, que amar é se ir morrendo pela vida afora
É refletir na lágrima um momento breve
De uma estrela pura cuja luz morreu
Numa noite escura, triste como eu...

domingo, 1 de fevereiro de 2009

"Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa.

Que nenhuma estrela queime o teu perfil
Que nenhum deus se lembre do teu nome
Que nem o vento passe onde tu passas.

Para ti eu criarei um dia puro
Livre como o vento e repetido
Como o florir das ondas ordenadas."

(Sophia de Mello Breyner Andresen)
"Naquela estação"
Composição: João Donato

Você entrou no trem
e eu na estação
Vendo um céu fugir
Também não dava mais para
tentar... Lhe convencer...
a não partir
E agora tudo bem
Você partiu...
para ver outras paisagens
e o meu coração embora
finja fazer mil viagens
fica batendo parado naquela estação

e o meu coração embora
finja fazer mil viagens
fica batendo parado naquela estação

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Olhos nos olhos

Composição: Chico Buarque

Quando você me deixou, meu bem
Me disse pra ser feliz e passar bem
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci
Mas depois, como era de costume, obedeci

Quando você me quiser rever
Já vai me encontrar refeita, pode crer
Olhos nos olhos
Quero ver o que você faz
Ao sentir que sem você eu passo bem demais

E que venho até remoçando
Me pego cantando, sem mais, nem por quê
Tantas águas rolaram
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você

Quando talvez precisar de mim
Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim
Olhos nos olhos
Quero ver o que você diz
Quero ver como suporta me ver tão feliz

domingo, 4 de janeiro de 2009

Dama da Noite

(Os Dragões Não Conhecem o Paraíso)

Para Márcia Denser


"E sonho esse sonho que se estende

em rua, em rua em rua

em vão."

Lucia Villares: Papos de Anjo


Como se eu estivesse por fora do movimento da vida. A vida rolando por aí feito roda-gigante, com todo mundo dentro, e eu aqui parada, pateta, sentada no bar. Sem fazer nada, como se tivesse desaprendido a linguagem dos outros. A linguagem que eles usam para se comunicar quando rodam assim e assim por diante nessa roda-gigante. Você tem um passe para a roda-gigante, uma senha, um código, sei lá. Você fala qualquer coisa tipo bá, por exemplo, então o cara deixa você entrar, sentar e rodar junto com os outros. Mas eu fico sempre do lado de fora. Aqui parada, sem saber a palavra certa, sem conseguir adivinhar. Olhando de fora, a cara cheia, louca de vontade de estar lá, rodando junto com eles nessa roda idiota - tá me entendendo, garotão? Nada, você não entende nada. Dama da noite. Todos me chamam e nem sabem que durmo o dia inteiro. Não suporto luz, também nunca tenho nada pra fazer - o quê? Umas rendas aí. É, macetes. Não dou detalhe, não adianta insistir. Mutreta, trambique, muamba. Já falei: não adianta insistir, boy . Aprendi que, se eu der detalhe, você vai sacar que tenho grana e se eu tenho grana você vai querer foder comigo só porque eu tenho grana. E acontece que eu ainda sou babaca, pateta e ridícula o suficiente para estar procurando O verdadeiro amor. Pára de rir, senão te jogo já este copo na cara. Pago o copo, a bebida. Pago o estrago e até o bar, se ficar a fim de quebrar tudo. Se eu tô tesuda e você anda duro e eu precisar de cacete, compro o teu, pago o teu. Quanto custa? Me diz que eu pago. Pago bebida, comida, dormida. E pago foda também, se for preciso. Pego, claro que eu pego. Pego sim, pego depois. É grande? Gosto de grande, bem grosso. Agora não. Agora quero falar na roda. Essa roda, você não vê, garotão? Está por aí. rodando aqui mesmo. Olha em volta, cara. Bem do teu lado. Naquela mina ali, de preto, a de cabelo arrepiadinho. Tá bom, eu sei: pelo menos dois terços do bar veste preto e tem cabelo arrepiadinho, inclusive nós. Sabe que se há uns dez anos eu pensasse em mim agora aqui sentada com você, eu não ia acreditar? Preto absorve vibração negativa, eu pensava. O contrário de branco, branco reflete. Mas acho que essa moçada tá mais a fim mesmo é de absorver, chupar até o fundo do mal - hein? Depois, até posso. Tem problema, não. Mas não é disso que estou falando agora, meu bem. Você não gosta? Ah, não me diga, garotinho. Mas se eu pago a bebida, eu digo o que eu quiser, entendeu? Eu digo meu-bem assim desse jeito, do jeito que eu bem entender. Digo e repito: meu-bem-meu-bem-meu-bem. Pego no seu queixo a hora que eu quiser também, enquanto digo e repito e redigo meu-bem-meu-bem. Queixo furadinho, hein? Já observei que homem de queixo furadinho gosta mesmo é de dar o rabo. Você já deu o seu? Pelo amor de Deus, não me venha com aquela história tipo sabe, uma noite, na casa de um pessoal em Boiçucanga, tive que dormir na mesma cama com um carinha. Todo machinho da sua idade tem loucura por dar o rabo, meu bem. Ascendente Câncer, eu sei: cara de lua, bunda gordinha e cu aceso. Não é vergonha nenhuma: tá nos astros, boy. Ou então é veado mesmo, e tudo bem. Levanta não, te pago outra vodca, quer? Só pra deixar eu falar mais na roda. Você é muito garoto, não entende dessas coisas. Deixa a vida te lavrar a cara, antes, então a gente... Bicho, esquisito: eu ia dizer alma, sabia? Quer que eu diga? Tá bom, se você faz tanta questão, posso dizer. Será que ainda consigo, como é que era mesmo? Assim: deixa a vida te lavrar a alma, antes, então a gente conversa. Deixa você passar dos trinta, trinta e cinco, ir chegando nos quarenta e não casar e nem ter esses monstros que eles chamam de filhos, casa própria nem porra nenhuma. Acordar no meio da tarde, de ressaca, olhar sua cara arrebentada no espelho. Sozinho em casa, sozinho na cidade, sozinho no mundo. Vai doer tanto, menino. Ai como eu queria tanto agora ter uma alma portuguesa para te aconchegar ao meu seio e te poupar essas futuras dores dilaceradas. Como queria tanto saber poder te avisar: vai pelo caminho da esquerda, boy, que pelo da direita tem lobo mau e solidão medonha. A roda? Não sei se é você que escolhe, não. Olha bem pra mim - tenho cara de quem escolheu alguma coisa na vida? Quando dei por mim, todo mundo já tinha decorado a tal palavrinha-chave e tava a mil, seu lugarzinho seguro, rodando na roda. Menos eu, menos eu. Quem roda na roda fica contente. Quem não roda se fode. Que nem eu, você acha que eu pareço muito fodida? Um pouco eu sei que sim, mas fala a verdade: muito? Falso, eu tenho uns amigos, sim. Fodidos que nem eu. Prefiro não andar com eles, me fazem mal. Gente da minha idade, mesmo tipo de... Ia dizer problema, puro hábito: não tem problema. Você sabe, umsaco. Que nem espelho: eu olho pra cara fodida deles e tá lá escrita escarrada a minha própria cara fodida também, igualzinha à cara deles. Alguns rodam na roda, mas rodam fodidamente. Não rodam que nem você. Você é tão inocente,

tão idiotinha com essa camisinha Mr. Wonderful. Inocente porque nem sabe que é inocente. Nem eles, meus amigos fodidos, sabem que não são mais. Tem umas coisas que a gente vai deixando, vai deixando, vai deixando de ser e nem percebe. Quando viu, babau, já não é mais. Mocidade é isso aí, sabia? Sabe nada: você roda na roda também, quer uma prova? Todo esse pessoal da preto e cabelo arrepiadinho sorri pra você porque você é igual a eles. Se pintar uma festa, te dão um toque, mesmo sem te conhecer. Isso é rodar na roda, meu bem. Pra mim, não. Nenhum sorriso. Cumplicidade zero. Eu não sou igual a eles, eles sabem disso. Dama da noite, eles falam, eu sei. Quando não falam coisa mais escrota, porque dama da noite é até bonito, eu acho. Aquela flor de cheiro enjoativo que só cheira de noite, sabe qual? Sabe porra: você nasceu dentro de um apartamento, vendo tevê. Não sabe nada. fora essas coisas de vídeo, performance, high-tech, punk, dark. computador, heavy-metal e o caralho. Sabia que eu até vezenquando tenho mais pena de você e desses arrepiadinhos de preto do que de mim e daqueles meus amigos fodidos? A gente teve uma hora que parecia que ia dar certo. Ia dar, ia dar. sabe quando vai dar? Pra vocês, nem isso. A gente teve a ilusão, mas vocês chegaram depois que mataram a ilusão da gente. Tava tudo morto quando você nasceu, boy, e eu já era puta velha. Então eu tenho pena. Acho que sou melhor, sei porque peguei a coisa viva. Tá bom, desculpa, gatinho. Melhor, melhor não. Eu tive mais sorte, foi isso? Eu cheguei antes. E até me pergunto se não é sorte também estar do lado de fora dessa roda besta que roda sem fim, sem mim. No fundo, tenho nojo dela - você? Você não viu nada, você nem viu o amor. Que idade você tem, vinte? Tem cara de doze. Já nasceu de camisinha em punho, morrendo de medo de pegar Aids. Vírus que mata. Neguinho, vírus do amor. Deu a bundinha, comeu cuzinho. Pronto: paranóia total. Semana seguinte, nasce uma espinha na cara e salve-se quem puder: baixou Emílio Ribas. Caganeira, tosse seca, gânglios generalizados. Ô boy, que grande merda fizeram com a tua cabecinha, hein? Você nem beija na boca sem morrer de cagaço. Transmite pela saliva, você leu em algum lugar. Você nem passa a mão em peito molhado sem ficar de cu na mão. Transmite pelo suor, você leu em algum lugar. Supondo que você lê, claro. Conta pra tia: você lê, meu bem? Nada, você não lê nada. Você vê pela tevê, eu sei. Mas na tevê também dá, o tempo todo: amor mata amor mata amor mata. Pega até de ficar do lado, beber do mesmo copo. Já pensou se eu tivesse? Eu, que já dei pra meia cidade e ainda por cima adoro veado. Eu sou a dama da noite que vai te contaminar com seu perfume venenoso e mortal. Eu sou a flor carnívora e noturna que vai te entontecer e te arrastar para o fundo de seu jardim pestilento. Eu sou a dama maldita que, sem nenhuma piedade, vai te poluir com todos os líquidos, contaminar teu sangue com todos os vírus. Cuidado comigo: eu sou a dama que mata, boy. Já chupou buceta de mulher? Claro que não, eu sei: pode matar. Nem caralho de homem: pode matar. Já sentiu aquele cheiro molhado que as pessoas têm nas virilhas quando tiram a roupa? Está escrito na sua cara, tudo que você não viu nem fez está escrito nessa sua cara que já nasceu de máscara pregada. Você já nasceu proibido de tocar no corpo do outro. Punheta pode, eu sei, mas essa sede de outro corpo é que nos deixa loucos e vai matando a gente aos pouquinhos. Você não conhece esse gosto que é o gosto que faz com que a gente fique fora da roda que roda e roda e que se foda rodando sem parar, porque o rodar dela é o rodar de quem consegue fingir que não viu o que viu. Ô boy, esse mundo sujo todo pesando em cima de você, muito mais do que de mim e eu ainda nem comecei a falar na morte... Já viu gente morta, boy? É feio, boy. A morte é muito feia, muito suja, muito triste. Queria eu tanto ser assim delicada e poderosa, para te conceder a vida eterna. Queria ser uma dama nobre e rica para te encerrar na torre do meu castelo e poupar você desse encontro inevitável com a morte. Cara a cara com ela, você já esteve? Eu, sim, tantas vezes. Eu sou curtida, meu bem. A gente lê na sua cara que nunca. Esse furinho de veado no queixo, esse olhinho verde me olhando assim que nem eu fosse a Isabella Rossellini levando porrada e gostando e pedindo eat me eat me, escrota e deslumbrante. Essa tontura que você está sentindo não é porre, não. É vertigem do pecado, meu bem, tontura do veneno. O quê que você vai contar amanhã na escola, hein? Sim, porque você ainda deve ir à escola, de lancheira e tudo. Já sei: conheci uma mina meio coroa, porra-louca demais. Cretino, cretino, pobre anjo cretino do fim de todas as coisas. Esse caralhinho gostoso aí, escondido no meio das asas, é só isso que você tem por enquanto. Um caralhinho gostoso, sem marca nenhuma. Todo rosadinho. E burro. Porque nem brochar você deve ter brochado ainda. Acorda de pau duro, uma tábua, tem tesão por tudo, até por fechadura. Quantas por dia? Muito bem, parabéns: você tá na idade. Mas anota aí pro teu futuro cair na real: essa sede, ninguém mata. Sexo é na cabeça: você não consegue nunca. Sexo é só na imaginação. Você goza com aquilo que imagina que te dá o gozo, não com uma pessoa real, entendeu? Você goza sempre com o que tá na sua cabeça, não com quem tá na cama. Sexo é mentira, sexo é loucura, sexo é sozinho, boy. Eu cansei. Já não estou mais na idade. Quantos? Ah, você não vai acreditar, esquece. O que importa é que você entra por um ouvido meu e sai pelo outro, sabia? Você não fica. Você não marca. Eu sei que fico em você, eu sei que marco você. Marco fundo. Eu sei que, daqui a um tempo, quando você estiver rodando na roda, vai lembrar que, uma noite sentou ao lado de uma mina louca que te disse coisas, que te falou no sexo, na solidão, na morte. Feia, tão feia a morte, boy. A pessoa fica meio verde, sabe? Da cor quase assim desse molho de espinafre frio. Mais clarinho um pouco, mas isso nem é o pior. Tem uma coisa que já não está mais ali, isso é o mais triste. Você olha, olha e olha e o corpo fica assim que nem uma cadeira. Uma mesa, um cinzeiro, um prato vazio. Uma coisa sem nada dentro. Que nem casca de amendoim jogada na areia, é assim que a gente fica quando morre, viu, boy? E você, já descobriu que um dia também vai morrer? Dou, claro. Ficou nervosinho, quer cigarro? Mas nem fumar você fuma, o quê? Compreendo, compreendo sim, eu compreendo sempre, sou uma mulher muito compreensiva. Sou tão maravilhosamente compreensiva e tudo que, se levar você pra minha cama agora e amanhã de manhã você tiver me roubado toda a grana, não pense que vou achar você um filho da puta. Não é o máximo da compreensão? Eu vou achar que você tá na sua, um garotinho roubando uma mulher meio pirada, meio coroa, que mexeu com sua cabecinha de anjo cretino desse nojento fim de todas as coisas. Tá tudo bem, é assim que as coisas são: ca-pi-ta-lis-tas, em letras góticas de neon. Mulher pirada e meio coroa que nem eu tem mais é que ser roubada por um garotinho ïmbecil e tesudinho como você. Só pra deixar de ser burra caindo outra vez nessa armadilha de sexo. Fissura, estou ficando tonta. Essa roda girando girando sem parar. Olha bem: quem roda nela? As mocinhas que querem casar, os mocinhos a fim de grana pra comprar um carro, os executivozinhos a fim de poder e dólares, os casais de saco cheio um do outro, mas segurando umas. Estar fora da roda é não segurar nenhuma, não querer nada. Feito eu: não seguro picas, não quero ninguém. Nem você. Quero não, boy. Se eu quiser, posso ter. Afinal, trata-se apenas de um cheque a menos no talão, mais barato que um par de sapatos. Mas eu quero mais é aquilo que não posso comprar. Nem é você que eu espero, já te falei. Aquele que vai entrar um dia talvez por essa mesma porta, sem avisar. Diferente dessa gente toda vestida de preto, com cabelo arrepiadinho. Se quiser eu piro, e imagino ele de capa de gabardine, chapéu molhado, barba de dois dias, cigarro no canto da boca, bem noir. Mas isso é filme, ele não. Ele é de um jeito que ainda não sei, porque nem vi. Vai olhar direto para mim. Ele vai sentar na minha mesa, me olhar no olho, pegar na minha mão, encostar seu joelho quente na minha coxa fria e dizer: vem comigo. É por ele que eu venho aqui, boy, quase toda noite. Não por você, por outros como você. Pra ele, me guardo. Ria de mim, mas estou aqui parada, bêbada, pateta e ridícula, só porque no meio desse lixo todo procuro o verdadeiro amor. Cuidado comigo: um dia encontro. Só por ele, por esse que ainda não veio. Te deixo essa grana agora, precisa troco não, pego a minha bolsa e dou ofora já. Está quase amanhecendo, boy. As damas da noite recolhem seu perfume com a luz do dia. Na sombra, sozinhas envenenam a si próprias com loucas fantasias. Divida essa sua juventude estúpida com a gatinha ali do lado, meu bem. Eu vou embora sozinha. Eu tenho um sonho, eu tenho um destino, e se bater o carro e arrebentar a cara toda saindo daqui continua tudo certo. Fora da roda, montada na minha loucura. Parada pateta ridícula porralouca solitária venenosa. Pós-tudo, sabe como? Darkérrima, modernésima, puro simulacro. Dá minha jaqueta, boy, que faz um puta frio lá fora e quando chega essa hora da noite eu me desencanto. Viro outra vez aquilo que sou todo dia, fechada sozinha perdida no meu quarto, longe da roda e de tudo: uma criança assustada.

"(...) Ele é de um jeito que ainda não sei, porque nem vi. Vai olhar direto para mim. Ele vai sentar na minha mesa, me olhar no olho, pegar na minha mão, encostar seu joelho quente na minha coxa fria e dizer: vem comigo. É por ele que eu venho aqui, boy, quase toda noite. Não por você, por outros como você. Pra ele, me guardo. Ria de mim, mas estou aqui parada, bêbada, pateta e ridícula, só porque no meio desse lixo todo procuro o verdadeiro amor. Cuidado comigo: um dia encontro. Só por ele, por esse que ainda não veio."

(Dama da Noite, C. F. Abreu)