sábado, 20 de dezembro de 2008


"Apesar das ruínas e da morte, onde sempre acabou cada ilusão, a força dos meus sonhos é tão forte que de tudo renasce a exaltação e nunca as minhas mãos estão vazias." (Sophia de Mello Breyner Andresen, Poesia, 1944)

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Para uma avenca partindo
(Caio Fernando Abreu)

Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas coisas assim que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabe nem como serão ditas nem como serão ouvidas, compreende? Olha, falta muito pouco tempo, e se eu não te disser agora talvez não diga nunca mais, porque tanto eu como você sentiremos uma falta enorme dessas coisas, e se elas não chegarem a ser ditas nem eu nem você nos sentiremos satisfeitos com tudo que existimos, porque elas não foram existidas completamente, entende, porque as vivemos apenas naquela dimensão em que é permitido viver, não, não é isso que eu quero dizer, não existe uma dimensão permitida e uma outra proibida, indevassável, não me entenda mal, mas é que a gente tem tanto medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver, no mais fundo, eu quero dizer, é isso mesmo, você está acompanhando meu raciocínio? Falava do mais fundo, desse que existe em você, em mim, em todos esses outros com suas malas, suas bolsas, suas maçãs, não, não sei porque todo mundo compra maçãs antes de viajar, nunca tinha pensado nisso, por favor, não me interrompa, realmente não sei, existem coisas que a gente ainda não pensou, que a gente talvez nunca pense, eu, por exemplo, nunca pensei que houvesse alguma coisa a dizer além de tudo o que já foi dito, ou melhor pensei sim, não, pensar propriamente dito não, mas eu sabia, é verdade que eu sabia, que havia uma outra coisa atrás e além das nossas mãos dadas, dos nossos corpos nus, eu dentro de você, e mesmo atrás dos silêncios, aqueles silêncios saciados, quando a gente descobria alguma coisa pequena para observar, um fio de luz coado pela janela, um latido de cão no meio da noite, você sabe que eu não falaria dessas coisas se não tivesse a certeza de que você sentia o mesmo que eu a respeito dos fios de luz, dos latidos de cães, é, eu não falaria, uma vez eu disse que a nossa diferença fundamental é que você era capaz apenas de viver as superfícies, enquanto eu era capaz de ir ao mais fundo, você riu porque eu dizia que não era cantando desvairadamente até ficar rouca que você ia conseguir saber alguma coisa a respeito de si própria, mas sabe, você tinha razão em rir daquele jeito porque eu também não tinha me dado conta de que enquanto ia dizendo aquelas coisas eu também cantava desvairadamente até ficar rouco, o que eu quero dizer é que nós dois cantamos desvairadamente até agora sem nos darmos contas, é por isso que estou tão rouco assim, não, não é dessa coisa de garganta que falo, é de uma outra de dentro, entende? Por favor, não ria dessa maneira nem fique consultando o relógio o tempo todo, não é preciso,deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim de um jeito completamente insuspeitado, assim como se você fosse apenas uma semente e eu plantasse você esperando ver uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de você apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço,claro, claro que eu compro uma revista pra você, eu sei, é bom ler durante a viagem, embora eu prefira ficar olhando pela janela e pensando coisas, estas mesmas coisas que estou tentando dizer a você sem conseguir, por favor, me ajuda, senão vai ser muito tarde, daqui a pouco não vai mais ser possível, e se eu não disser tudo não poderei nem dizer e nem fazer mais nada, é preciso que a gente tente de todas as maneiras, é o que estou fazendo, sim, esta é minha última tentativa, olha, é bom você pegar sua passagem, porque você sempre perde tudo nessa sua bolsa, não sei como é que você consegue, é bom você ficar com ela na mão para evitar qualquer atraso, sim, é bom evitar os atrasos, mas agora escuta: eu queria te dizer uma porção de coisas, de uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor não é? Por isso não importa, eu queria era te dizer dessas vezes em que eu te deixava e depois saía sozinho, pensando também nas coisas que eu não ia te dizer, porque existem coisas terríveis, eu me perguntava se você era capaz de ouvir, sim, era preciso estar disponível para ouvi-las, disponível em relação a quê? Não sei, não me interrompa agora que estou quase conseguindo, disponível só, não é uma palavra bonita? Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende? Dolorido-colorido, estou repetindo devagar para que você possa compreender, melhor, claro que eu dou um cigarro pra você, não, ainda não, faltam uns cinco minutos, eu sei que não devia fumar tanto, é eu sei que os meus dentes estão ficando escuros, e essa tosse intolerável, você acha mesmo a minha tosse intolerável? Eu estava dizendo, o que é mesmo que eu estava dizendo? Ah: sabe, entre duas pessoas essas coisas sempre devem ser ditas, o fato de você achar minha tosse intolerável, por exemplo, eu poderia me aprofundar nisso e concluir que você não gosta de mim o suficiente, porque se você gostasse, gostaria também da minha tosse, dos meus dentes escuros, mas não aprofundando não concluo nada, fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa, de como eu olhava o relógio e andava de lá pra cá sem pensar definidamente e nada, mas não, não é isso, eu ainda queria chegar mais perto daquilo que está lá no centro e que um dia destes eu descobri existindo, porque eu nem supunha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas as coisas, é por isso que estou falando, fecha a revista, por favor,olha, se você não prestar muita atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito do Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavras, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maçãs ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo numa só frase, você vai ......... ............ ............. ............ .......... ........... ............. ............ ............ ............ ......... ........... ............ ............sim, eu sei, eu vou escrever, não eu não vou escrever, mas é bom você botar um casaco, está esfriando tanto, depois, na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? Escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as botas, fica tranqüila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo, e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? Eu preciso de muito silêncio e de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008


sou só saudade, viu, Mônica...
Melissa - Num Lugar do Coração


Num lugar do coração
Melissa

Passa o tempo e não esqueço
Coisas que marcaram o coração
A saudade dói no peito
Mas me alegro pela sua decisão

Pois não foi você quem escolheu
Foi Jesus quem te chamou
Pode crer, eu torço muito
Para seres uma bênção onde for

Os amigos são para sempre
Nada pode separar
Na alegria ou na tristeza
Sempre juntos vão estar

Nem tão pouco a distância
Me fará te esquecer
Num lugar do coração está você

Mesmo estando longe, amigo
Saiba que estou perto de você
Pelos olhos do Senhor te vejo
E peço a Ele a tua proteção

Pois não foi você quem me escolheu
Foi o Senhor quem te chamou
Pode crer, eu torço muito
Para seres uma bênção onde for

Epitáfio

Composição: Sérgio Britto

Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer...

Queria ter aceitado
As pessoas como elas são
Cada um sabe alegria
E a dor que traz no coração...

O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar...

Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr
Devia ter me importado menos
Com problemas pequenos
Ter morrido de amor...

Queria ter aceitado
A vida como ela é
A cada um cabe alegrias
E a tristeza que vier...

O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar...(2x)

Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr...

Benditas

Composição: Martá’nália - Zélia Duncan

Benditas coisas que eu não sei
Os lugares onde não fui
Os gostos que não provei
Meus verdes ainda não maduros
Os espaços que ainda procuro
Os amores que eu nunca encontrei
Benditas coisas que não sejam benditas


A vida é curta
Mas enquanto dura
Posso durante um minuto ou mais
Te beijar pra sempre o amor não mente, não
mente jamais
E desconhece do relógio o velho futuro
O tempo escorre num piscar de olhos
E dura muito além dos nossos sonhos mais puros
Bom é não saber o quanto a vida dura
Ou se estarei aqui na primavera futura
Posso brincar de eternidade agora
Sem culpa nenhuma

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

"(...) Se por acaso morrer
Do coração
É sinal que amei demais.
Mas enquanto estou viva
Cheia de graça
Talvez ainda faça
Um monte de gente feliz..."

("Saúde", Rita Lee")

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

a vida é tão frágil...




"Quem quer morrer, morre. Não pensa em outra coisa; apenas em morrer."

"Em algum lugar da vida eu me deixei ficar..."

(F. Sabino)

domingo, 14 de setembro de 2008

"A valsa de quem não tem amor"
composição: indisponível

Minhas noites são fatais
meus dias tão iguais
tão só sem ter ninguém
minha imaginação destrói meu coração
que vive na ilusão de um dia amar alguem
nesta imensa solidão
a minha confissão ecoa tristemente
cantarei sozinho imerso em minha dor
a valsa de quem não tem amor!

terça-feira, 2 de setembro de 2008

João...

"Astronauta"

Composição: Indisponível

Ela agora
Mora só no pensamento
Ou então no firmamento
Em tudo que no céu viaja
Pode ser um astronauta
Ou ainda um Passarinho
Ou virou um pé de vento
Pipa de papel de seda
Ou quem sabe um balãozinho
Pode estar num asteróide
Pode ser a estrela Dalva
Que daqui se olha
Pode estar morando em Marte
Nunca mais se soube dela
Desapareceu

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

"Lamento sertanejo"
Dominguinhos/ Gilberto Gil

Por ser de lá
Do sertão, lá do cerrado
Lá do interior do mato
Da caatinga do roçado.
Eu quase não saio
Eu quase não tenho amigos
Eu quase que não consigo
Ficar na cidade sem viver contrariado.

Por ser de lá
Na certa por isso mesmo
Não gosto de cama mole
Não sei comer sem torresmo.
Eu quase não falo
Eu quase não sei de nada
Sou como rês desgarrada
Nessa multidão boiada caminhando a esmo.

domingo, 17 de agosto de 2008

grande problema...

Elizeth Cardoso, Maria Bethânia, Maysa, Elis Regina ou Altemar Dutra?

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

"Grão de mar"

Composição: Marcelo Arantes / Chico César

Lá no meu sertão plantei
Sementes de mar
Grãos de navegar
Partir
So de imaginar, eu vi
Água de aguardar
Onda a me levar
E eu quase fui feliz

Mas nos longes onde andei
Nada de achar
Mar que semeei, perdi
A flor do sertão caiu
Pedra de plantar
Rosa que não há
Não dá
Não dói, nem diz

E o mar ficou lá no sertão
E o meu sertão em nenhum lugar
Como o amor que eu nunca encontrei
Mas existe em mim

domingo, 3 de agosto de 2008

"Doralice"
Composição: Dorival Caymmi/ Antônio Almeida

Doralice, eu bem que lhe disse
amar é tolice, é bobagem, é ilusão
Eu prefiro viver tão sozinho ao som do lamento do meu violão
Doralice, eu bem que lhe disse
olha essa embrulhada em que vou me meter
Agora, amor, Doralice, meu bem, como é que nós vamos fazer?

Um belo dia você me surgiu
eu quis fugir mas você insistiu
Alguma coisa bem que andava me avisando
até parece que eu estava adivinhando
Eu bem que não queria me casar contigo
bem que não queria enfrentar esse perigo, Doralice
Agora você tem que me dizer como é que nós vamos fazer?

sexta-feira, 1 de agosto de 2008


*será que a luz do sol está formando um coração? ou será simplesmente uma interrogação?

"Poema azul"
Composição: Sérgio Ricardo
Na voz de Maria Bethânia

O mar beijando a areia
O céu e a lua cheia
Que cai no mar
Que abraça a areia
Que mostra o céu
E a lua cheia
Que prateia
Os cabelos do meu bem.
Que olhar o mar beijando a areia
E uma estrelinha solta no céu
Que cai no mar
Que abraça a areia
Que mostra ao céu e à lua cheia
Um beijo meu.

Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim. A tua beleza aumenta quando estamos sós. E tão fundo, intimamente, a tua voz segue o mais secreto bailar do meu sonho, que momentos há em que eu suponho seres um milagre criado só pra mim.
(Sophia de Mello Breyner)

quarta-feira, 30 de julho de 2008

"Como 2 e 2"
Caetano Veloso
na voz do Roberto Carlos, por favor.

Quando você me ouvir cantar
Venha não creia eu não corro perigo
Digo não digo não ligo, deixo no ar
Eu sigo apenas porque eu gosto de cantar
Tudo vai mal, tudo
Tudo é igual quando eu canto e sou mudo
Mas eu não minto não minto
Estou longe e perto
Sinto alegrias tristezas e brinco

Meu amor
Tudo em volta está deserto tudo certo
Tudo certo como dois e dois são cinco

Quando você me ouvir chorar
Tente não cante não conte comigo
Falo não calo não falo deixo sangrar
Algumas lágrimas bastam pra consolar
Tudo vai mal, tudo
Tudo mudou não me iludo e contudo
A mesma porta sem trinco, o mesmo teto
E a mesma lua a furar nosso zinco

Meu amor
Tudo em volta está deserto tudo certo
Tudo certo como dois e dois são cinco
Meu amor
Tudo em volta está deserto tudo certo
Tudo certo como dois e dois são cinco
Meu amor
Tudo em volta está deserto tudo certo
Tudo certo como dois e dois são cinco

terça-feira, 29 de julho de 2008

Beatriz...

Composição: Edu Lobo/Chico Buarque

Olha
Será que ela é moça
Será que ela é triste
Será que é o contrário
Será que é pintura
O rosto da atriz

Se ela dança no sétimo céu
Se ela acredita que é outro país
E se ela só decora o seu papel
E se eu pudesse entrar na sua vida

Olha
Será que ela é de louça
Será que é de éter
Será que é loucura
Será que é cenário
A casa da atriz
Se ela mora num arranha-céu
E se as paredes são feitas de giz
E se ela chora num quarto de hotel
E se eu pudesse entrar na sua vida

Sim, me leva pra sempre, Beatriz
Me ensina a não andar com os pés no chão
Para sempre é sempre por um triz
Aí, diz quantos desastres tem na minha mão
Diz se é perigoso a gente ser feliz

Olha
Será que é uma estrela
Será que é mentira
Será que é comédia
Será que é divina
A vida da atriz
Se ela um dia despencar do céu
E se os pagantes exigirem bis
E se o arcanjo passar o chapéu
E se eu pudesse entrar na sua vida

segunda-feira, 14 de julho de 2008

spotless mind...

"Everybody's gotta learn sometime"
compositor: não sei...


Change your heart
Look around you
Change your heart
It will astound you
I need your lovin'
Like the sunshine

Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime

Change your heart
Look around you
Change your heart
Will astound you
I need your lovin'
Like the sunshine

Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime

I need your lovin'
Like the sunshine

Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime

Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime

Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime
Everybody's gotta learn sometime

quarta-feira, 9 de julho de 2008

"Fera ferida"
Composição: Roberto Carlos e Erasmos Carlos

Acabei com tudo, escapei com vida, tive as roupas e os sonhos rasgados na minha saída.
Mas saí ferido,sufocando o meu gemido, fui o alvo perfeito, muitas vezes no peito atingido.
Animal arisco, domesticado esquece o risco, me deixei enganar e até me levar por você.
Eu sei quanta tristeza eu tive, mas mesmo assim se vive, morrendo aos poucos por amor.
Eu sei, o coração perdoa, mas não esquece à toa, o que eu não me esqueci.
Eu andei demais, não olhei pra trás, era solta em meus passos, bicho livre sem rumo sem laços.
Me senti sozinha, tropeçando em meu caminho, à procura de abrigo,uma ajuda um lugar um amigo.
Animal ferido, por instinto decidido, os meus passos desfiz, tentativa infeliz de esquecer.
Eu sei que flores existiram, mas que não resistiram à vendavais constantes.
Eu sei, as cicatrizes falam, mas as palavras calam, o que eu não me esqueci.
Não vou mudar, esse caso não tem solução, sou fera ferida, no corpo na alma e no coração.
Eu sei que flores existiram, mas que não resistiram à vendavais constantes.
Eu sei, as cicatrizes falam, mas as palavras calam, o que eu não me esqueci.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

"(...) Andei amando loucamente, como há muito tempo não acontecia. De repente a coisa começou a desacontecer. Bebi, chorei, ouvi Maria Bethânia, fumei demais, tive insônia e excesso de sono, falta de apetite e apetite em excesso, vaguei pelas madrugadas, escrevi poemas (juro). Agora está passando: um band-aid no coração, um sorriso nos lábios – e tudo bem. Ou: que se há de fazer."

(trecho de uma carta de Caio Fernando Abreu para Emediato, em 28 de dezembro de 1976)

sábado, 28 de junho de 2008

Ai, Elizeth...

"Todo o sentimento"
Composição: Cristóvão Bastos e Chico Buarque

Preciso não dormir
Até se consumar
O tempo
Da gente
Preciso conduzir
Um tempo de te amar
Te amando devagar
E urgentemente
Pretendo descobrir
No último momento
Um tempo que refaz o que desfez
Que recolhe todo o sentimento
E bota no corpo uma outra vez

Prometo te querer
Até o amor cair
Doente
Doente
Prefiro então partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente
Depois de te perder
Te encontro, com certeza
Talvez num tempo da delicadeza
Onde não diremos nada
Nada aconteceu
Apenas seguirei, como encantado
Ao lado teu
"Canção da manhã feliz"

Composição: Indisponível

Luminosa manhã
Tanto céu, tanta luz
Dá-me um pouco céu
Mas não tanto azul!
Dá-me um pouco de festa, não esta
Que é demais pros meus anseios;
Você sabe, manhã, ele veio!
Despertou-me sorrindo
E até me beijou...
Eu abri a janela
E este sol entrou
De repente em minha vida
Já tão fria e sem desejos,
Estes festejos, esta emoção.
Luminosa manhã!
Tanto céu tanto azul
É demais
Para o meu coração!
"Janelas abertas"

Composição: Tom Jobim / Vinicius de Moraes

Sim, eu poderia fugir, meu amor,
Eu poderia partir
Sem dizer pra onde vou
Nem se devo voltar;
Sim, eu poderia morrer de dor,
Eu poderia morrer
E me serenizar...

Ah! eu poderia ficar sempre assim
Como uma casa sombria
Uma casa vazia
Sem luz nem calor.
Mas, quero as janelas abrir
Para que o sol possa vir
Iluminar nosso amor.
"Modinha"

Composição: Antonio Carlos Jobim / Vinicius de Moraes

Não
Não pode mais meu coração
Viver assim dilacerado
Escravizado a uma ilusão
Que é só desilusão

Ah, não seja a vida sempre assim
Como um luar desesperado
A derramar melancolia em mim
Poesia em mim

Vai, triste canção, sai do meu peito
E semeia a emoção
Que chora dentro do meu coração
Coração
"Valsa da solidão"

Composição: Paulinho da Viola/Hermínio Bello de Carvalho

Onde estava tanta estrela que eu não via
Onde estavam os meus olhos que não te encontravam
Onde foi que pisei e não senti
No ruído dos teus passos em meu caminho.

Onde foi que vivi
Se nem me lembro se existi
Longe de você.

Ah! Foi você quem trouxe essa tarde fria
E essa estrela pousada em meu peito
Ah! Foi você quem trouxe todo esse vazio
E toda essa saudade, toda essa vontade de morrer de amor.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

"(...) deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim de um jeito completamente insuspeitado, assim como se você fosse apenas uma semente e eu plantasse você esperando ver uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de você apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço, (...)"

(Caio Fernando Abreu, "Para uma avenca partindo")

quarta-feira, 4 de junho de 2008

"Benditas"

(Mart’nália e Zélia Duncan)

Benditas coisas que eu não sei
Os lugares onde não fui
Os gostos que não provei
Meus verdes ainda não maduros
Os espaços que ainda procuro
Os amores que eu nunca encontrei
Benditas coisas que não sejam benditas


A vida é curta
Mas enquanto dura
Posso durante um minuto ou mais
Te beijar pra sempre o amor não mente, não
mente jamais
E desconhece do relógio o velho futuro
O tempo escorre num piscar de olhos
E dura muito além dos nossos sonhos mais puros
Bom é não saber o quanto a vida dura
Ou se estarei aqui na primavera futura
Posso brincar de eternidade agora
Sem culpa nenhuma

domingo, 1 de junho de 2008

"(...)
Nunca mais romance
Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing
Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz"

(A história de Lily Braun, de Chico Buarque e Edu Lobo)

domingo, 18 de maio de 2008

"Prece"

Senhor, que és o céu e a terra,
que és a vida e a morte!
O sol és tu e a lua és tu e o vento és tu!
Tu és os nossos corpos e as nossas almas
e o nosso amor és tu também.
Onde nada está tu habitas
e onde tudo está - (o teu templo) - eis o teu corpo.


Dá-me alma para te servir e alma para te amar.
Dá-me vista para te ver sempre no céu e na terra,
ouvidos para te ouvir no vento e no mar,
e mãos para trabalhar em teu nome.


Torna-me puro como a água e alto como o céu.
Que não haja lama nas estradas dos meus pensamentos
nem folhas mortas nas lagoas dos meus propósitos.


Faze com que eu saiba amar os outros como irmãos
e servir-te como a um pai.


Minha vida seja digna da tua presença.
Meu corpo seja digno da terra, tua cama.
Minha alma possa aparecer diante de ti
como um filho que volta ao lar.


Torna-me grande como o Sol,
para que eu te possa adorar em mim;
e torna-me puro como a lua,
para que eu te possa rezar em mim;
e torna-me claro como o dia
para que eu te possa ver sempre em mim
e rezar-te e adorar-te.


Senhor, protege-me e ampara-me.
Dá-me que eu me sinta teu.
Senhor, livra-me de mim.


(Fernando Pessoa)

terça-feira, 13 de maio de 2008

"Nhem-nhem-nhem
Nhem-nhem ô xorodô
Nhem-nhem-nhem
Nhem-nhem ô xorodô
É o mar, é o mar
Fé-fé xorodô (...)"

(Toquinho e Vinícius de Morais)

quarta-feira, 7 de maio de 2008

“Quanto a mim, o amor passou. Eu só lhe peço que nao faça como gente vulgar e nao me volte a cara quando passe por si e nem tenha de mim uma recordacao em que entre o rancor. Fiquemos um perante o outro, como dois conhecidos desde a infancia que se amaram um pouco quando meninos. Embora na vida adulta sigam outras afeiçoes, conservam, num escaninho da alma, a memoria de seu amor antigo e inútil.”
(Fernando Pessoa)

*escrito roubado de www.meuscincoamigos.blogspot.com

segunda-feira, 28 de abril de 2008

"Sou eu"
(Álvaro de Campos)

"(...)
Sou eu aqui em mim, sou eu.
Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou.
Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma.
Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim. (...)"
"Quem é essa agora?"
(Lya Luft)

Quem é essa agora?

Que dentro de mim
Me assusta e me atrai
Sorrateira ela sou eu
Ou é alguma sombra
Que me segue como bicho
Rastejando nos calcanhares
da minha alma
Lá está, lá está
Sabe tudo, faz tudo
Eu sou apenas ferramenta
Garganta pela qual
Ela chama, chama, chama...

quinta-feira, 17 de abril de 2008

"Menininha"
Vinícius de Moraes

Menininha do meu coração
eu so quero você
a três palmos do chão
Menininha não cresca mais não
fique pequinininha
nessa minha canção
senhorinha levada
batendo palminha
fingindo assustada do bicho-papão

Menininha que graça é voce
uma coisinha assim
começando a viver
fique assim
meu amor
sem crescer
porque o mundo e ruim
e ruim e você vai sofrer de repente
uma desilusão porque a vida é somente o seu bicho-papão

Fique assim,
fique assim,
sempre assim
e se lembre de mim
pelas coisas
que eu dei
e tambem não se esqueca de mim
quando você souber enfim
de tudo o que eu amei...

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Parece filme...

Má-drugada, apagando mensagens no celular, tentando (não) esquecê-las, chuva forte e "Na sua estante" repetindo no meu ouvido. Claro que tô chorando...




mas logo vem outra coisa pra desviar a atenção e lembrar que o caminho é sempre pra frente.
"A quoi ça sert l'amour"
composição: indisponível

A quoi ça sert, l’amour ?

On raconte toujours
Des histoires insensées
A quoi ça sert d’aimer ?

L’amour ne s’explique pas !
C’est une chose comme ça !
Qui vient on ne sait d’où
Et vous prend tout à coup.

Moi, j’ai entendu dire
Que l’amour fait souffrir,
Que l’amour fait pleurer,
A quoi ça sert d’aimer ?

L’amour, ça sert à quoi ?
A nous donner d’la joie
Avec des larmes aux yeux…
C’est triste et merveilleux !

Pourtant on dit souvent
Que l’amour est décevant
Qu’il y a un sur deux
Qui n’est jamais heureux…

Même quand on l’a perdu
L’amour qu’on a connu
Vous laisse un gout du miel -
L’amour c’est éternel !

Tout ça c’est très joli,
Mais quand tout est fini
Il ne vous reste rien
Qu’un immense chagrin…

Tout ce qui maintenant
Te semble déchirant
Demain, sera pour toi
Un souvenir de joie !

En somme, si j’ai compris,
Sans amour dans la vie,
Sans ses joies, ses chagrins,
On a vécu pour rien ?

Mais oui! Regarde-moi !
A chaque fois j’y crois !
Et j’y croirait toujours…
Ça sert à ça l’amour !

Mais toi, tu es le dernier !
Mais toi’ tu es le premier !
Avant toi y avait rien
Avec toi je suis bien !

C’est toi que je voulais !
C’est toi qu’il me fallait !
Toi que j’aimerais toujours…
Ça sert à ça l’amour !

domingo, 13 de abril de 2008

Na má-drugada, muitas vezes, encontramos ótimas companhias... Os poetas sempre são presentes.


Ausência

Eu vou deixar que morra em mim,
o desejo de amar os teus olhos que são doces,
porque nada te poderei dar,
senão a mágoa de me veres eternamente exausta.
No entanto, a tua presença
é qualquer coisa como a luz e a vida,
e eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto,
e em minha voz, a tua voz.
Não te quero ter, porque em meu ser tudo estaria terminado,
quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados,
para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada,
que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei,
tu irás e encostarás a tua face em outra face,
teus dedos enlaçarão outros dedos,
e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,
porque eu fui o grande íntimo da noite,
porque eu encostei a minha face na face da noite,
e ouvi a sua fala amorosa,
porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço,
e eu trouxe até mim, a misteriosa essência do teu abandono desordenado. Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos.
Mas eu te possuirei mais que ninguém,
porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, dos céus, das aves, das estrelas,
serão a tua voz ausente,
a tua voz presente,
a tua voz serenizada.

Vinícius de Moraes
Primavera
Composição: Carlos Lyra / Vinícius de Moraes

O meu amor sozinho é assim como um jardim sem flor
Só queria poder ir dizer a ela como é triste se sentir saudade
É que eu gosto tanto dela que é capaz dela gostar de mim
E acontece que eu estou mais longe dela
Que da estrela a reluzir na tarde
Estrela, eu lhe diria, desce à terra, o amor existe
E a poesia só espera ver
Nascer a primavera
Para nunca mais morrer
Não há amor sozinho
É juntinho que ele fica bom
Eu queria dar-lhe todo o meu carinho
Eu queria ter felicidade
É que o meu amor é tanto
É um encanto que não tem mais fim
E no entanto ele nem sabe que isso existe
E é tão triste se sentir saudade
Amor, eu lhe direi
Amor que eu tanto procurei
Ai quem me dera eu pudesse ser
A sua primavera e depois morrer

"...Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora, mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido..."
(Pablo Neruda)

sábado, 12 de abril de 2008

má-drugada...

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Monólogo de Orfeu

Composição: Vinicius de Moraes / Antonio Carlos Jobim

Mulher mais adorada!
Agora que não estás, deixa que rompa
O meu peito em soluços! Te enrustiste
Em minha vida; e cada hora que passa
É mais por que te amar, a hora derrama
O seu óleo de amor, em mim, amada...
E sabes de uma coisa? Cada vez
Que o sofrimento vem, essa saudade
De estar perto, se longe, ou estar mais perto
Se perto, – que é que eu sei! Essa agonia
De viver fraco, o peito extravasado
O mel correndo; essa incapacidade
De me sentir mais eu, Orfeu; tudo isso
Que é bem capaz de confundir o espírito
De um homem – nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga
Esse contentamento, essa harmonia
Esse corpo! E me dizes essas coisas
Que me dão essa força, essa coragem
Esse orgulho de rei. Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música!
Nunca fujas de mim! Sem ti sou nada
Sou coisa sem razão, jogada, sou
Pedra rolada. Orfeu menos Eurídice...
Coisa incompreensível! A existência
Sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos. Tu
És a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo, minha amiga
Mais querida! Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! Criatura! Quem
Poderia pensar que Orfeu: Orfeu
Cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres - que ele, Orfeu
Ficasse assim rendido aos teus encantos!
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho que eu vou te seguindo
No pensamento e aqui me deixo rente
Quando voltares, pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo!
Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que estarei contigo!

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Valsa da Solidão, com Roberta Sá


Composição: Paulinho da Viola/Hermínio Bello de Carvalho

Onde estava tanta estrela que eu não via
Onde estavam os meus olhos que não te encontravam
Onde foi que pisei e não senti
No ruído dos teus passos em meu caminho.

Onde foi que vivi
Se nem me lembro se existi
Longe de você.

Ah! Foi você quem trouxe essa tarde fria
E essa estrela pousada em meu peito
Ah! Foi você quem trouxe todo esse vazio
E toda essa saudade, toda essa vontade de morrer de amor.

domingo, 30 de março de 2008


(Sakuntala, de Camille Claudel)
"Neste mesmo ano (1888) produz Sakuntala escultura inspirada no conto do poeta hindu Kalidassa. Uma mulher grávida que procura o marido, que não a reconhecerá, pois ela perde a insígnia que a nomeava sua rainha e assim a toma como impostora. Sakuntala se retira em desespero e uma chama em forma de mulher a levanta e ambas desaparecem."

http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/4.30.3.1.htm

sábado, 22 de março de 2008

Que nunca percamos a capacidade de amar... E que aceitemos sempre correr os maravilhosos riscos de ser feliz...

segunda-feira, 17 de março de 2008

Não só de passagem...

Normalmente, eu não gosto de ser marionete para as pessoas. Quando elas me tem com tanto poder, muitas vezes meu coração não acaba bem. Contudo, quando estou num teatro e sou controlado pela encenação, eu amo! Amo sofrer ou rir com aqueles personagens. Em “En Passant”, eu fui manipulado completamente. Fui um corpo morto com o qual eles fizeram tudo. Fui das risadas altas ao riso com a mão na boca para não atrapalhar os outros espectadores.

Numa madrugada qualquer em qualquer praça, duas pessoas quaisquer se encontram. Um homem e uma mulher. Não sabemos o que cada um carrega, quais os motivos que os levaram até ali. Logo sabemos que é dor... Dor que não se explica... Mas que se sente fundo e maltrata.

Através de cenas curtas, os dias vão passando e à platéia são apresentados os diálogos (muitas vezes sem razão lógica) que aqueles dois conseguem travar. E nos sentimos sentados num balanço do lado deles dividindo aquele turbilhão de sensações que não conseguimos explicar nem definir.

O que será que lhes prende àquele lugar? Será apenas um grande cachecol que insiste em se amarrar a um balanço? Não... Eles encontraram um igual... Ou, talvez... Lá eles podem ser por completo... Ou o mais perto que chegam de ser completos. Por que voltar durante as madrugadas? As madrugadas são as piores horas... O silêncio é tanto que maltrata e a solidão faz questão de se mostrar presente e forte.

E todo o sentimento é dado para a platéia... Perdeu demais aquele que esteve no teatro mais não se permitiu ser manipulado por aquela história. Interpretações tão vivas, tão verdadeiras! Aqueles personagens existem! Sou eu e mais um monte de amigos que nas madrugadas difíceis saem em busca de alguma praça, como se nela estivesse uma receita para o coração ficar tranquilo.

A encenação é muito bem cuidada. Opta-se por uma espécie de jogo cinematográfico que enche os olhos da platéia. É quase palpável uma edição cinematográfica, que dá dinamismo, movimento à vida lenta daqueles seres contada de forma sem pressa. Nada ali sobra. Tudo tem seu canto, tudo está acomodado. Até nós mesmos, espectadores, nos aconchegamos do lado dEle e dEla para ouvir suas histórias.

A interpretação de Milena Pitombeira controla todos os olhares. Uma energia fortemente pulsante sai dela e toma todos. As intenções são precisas, assim como os gestos. O mais mágico é sentir como se nós fôssemos ela. Queremos pular também, precisamos de uma salvação! Jadeilson Feitosa nos mostra um homem mais cheio de dor, de silêncios. Causa arrepios nos pescoços da platéia ao enrolar freneticamente o cachecol como num último gesto. Um pouco menos de qualidade que a atriz, o que é bastante comum quando o ator assume a direção (embora eu não aceite esse justificativa). Mas Ele também tem força pra pegar o coração de quem assiste “En passant” e apertar com mãos fortes quando diz algumas frases de efeito.

A iluminação de Walter Façanha é linda (algo completamente esperado quando se trata do trabalho desse iluminador). Aceita a proposta da direção e a engrandece. As transições, o piscar de luz e os focos tão bem marcados deixa tudo com um clima de sonho ou de madrugada desperta. A sonoplastia é belíssima! Possui uma unidade completa, como se fosse feita exclusivamente para o espetáculo. Desde a primeira nota, ela é um veículo para a platéia ser puxada para a vida mostrada naquele palco.

A maquiagem, o cenário e o figurino de Yuri Yamamoto fazem jus ao que ele é para mim: um gênio. E a genialidade está na simplicidade daqueles balanços e daquele poste ao contrário (nossa, como ninguém pensou nisso antes!). A praça tem um tom onírico com aqueles elementos, mas não deixa de existir. E a platéia fica se perguntando onde existe isso, qual o limiar do palpável e da imaginação no meio daquelas loucuras. O figurino tão cinza parece que quer ser mais forte que o vermelho vivo que existe neles. Tolice... Ainda tem vida naqueles seres, mesmo que difícil de ser percebida.



Hoje, domingo, quase 24 horas depois de ter visto a peça, ainda estou submerso naquele universo. E vou ficar assim por alguns dias... Embora os personagens digam que não é o tempo que passa, e sim eles!, comigo não acontece assim. Eles estão presentes nos meus pensamentos como grandes amigos, ou, pior, como a mim mesmo. Eu sou Ele e Ela, aquela praça é minha cabeça e as madrugadas são diárias. Também busco um momento de redenção, seja num beijo, seja num grito, seja num pulo. Espero aquele momento de abandonar meu cachecol no balanço e sair... Como será que eu vou sair? ... Vivo ou morto?

Tô com vontade de chorar. E agora sinto vergonha das risadas que dei ao ver o espetáculo. Mas eram risadas como fuga, porque aquilo é ridículo, e me vejo ridículo também. Não tô sozinho... Quer dizer, estou sozinho. Não. Eu estou com minhas sensações, que foram despertadas por “En passant”, que não foi só de passagem na minha vida...





Serviço: En passant, texto de Rafael Martins sob direção de Jadeilson Feitosa. No elenco, Milena Pitombeira e Jadeilson Feitosa. Aos sábados e domingos de abril no teatro Sesc Emiliano Queiroz sempre às 20 horas. Ingressos: 12 reais (inteira) e 6 reais (meia)
(Nas fotos: Milena Pitombeira e Jadeilson Feitosa
Créditos: Divulgação do espetáculo)

(16.março.2008)

quinta-feira, 6 de março de 2008

NONO FRAGMENTO DA DÉCIMA TERCEIRA VOZ

"O gosto é bom, eu te dizia. E não impede a asa, a seta disparada em direção a Hydrus, Eridanus. Mas primeira prova da terra. Depois, voa. Não aprendeste com Ícaro? Só não queiras tocar o Carro de Apolo. Ah quanta Ânsia Sufocante de Pureza. Quanta Mentira Adocicada. Lixo gritarei na tua cara, pura merda. Merda fedida de quem bebeu demais na noite anterior. Conheces bem a cor escura, o cheiro estranho de álcool. Não me venhas com Espiritualidades Trancendentais. Tenho mais nojo de tuas flores amarelas que de teu cu. Tua alma me importa menos que o cheiro de teu suor. Espera - também-não-é-tudo-assim-escuridão-e-morte, já dizia HH. Pára de te debater, não vais aguentar. A mulher dos comprimidos já te olhou desconfiada. A garganta dói, provei o que não devia. A cabeça me pesa, pensei o impermitido. Tens que te movimentar no meio desses brilharecos. Tens que desmenti-los um por um. A cada dia assassinar o pai, estuprar a mãe. Pára de sonhar coloridices. Tenho asco de tuas fitas coloridas, teus perfumes. Foi assim que vocês todos morreram antes do tempo. Foi assim que eu não morri. Embora oco, estou no alto da torre, na Curva das Tormentas, as janelas abertas para que entrem todos os demônios. Os anjos também."


(Caio Fernando Abreu, Triângulo das águas, L&PM Pocket)

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008


"(...)
E ainda se vier noites traiçoeiras, se a cruz pesada for Cristo estará contigo! O mundo pode até fazer você chorar mas Deus te quer sorindo! ..."

Como o seu sorriso lindo que sempre está na minha cabeça.









só saudade, Mônica...

sábado, 16 de fevereiro de 2008

"Sozinho em casa, sozinho na cidade, sozinho no

mundo. Vai doer tanto, menino. Ai como eu queria tanto

agora ter uma alma portuguesa para te aconchegar ao meu

seio e te poupar essas futuras dores dilaceradas. Como queria

tanto saber e poder te avisar: vai pelo caminho da esquerda,

boy, que pelo da direita tem lobo mau e solidão medonha."

(trecho de Dama da noite, de Caio Fernando Abreu)

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

E a água correndo pro mar...


"Meu amor me deixou
(e a água correndo pro mar)
Arranjou outro amor
(e a água correndo pro mar)
Foi pra São Salvador
(e a água correndo pro mar)
Laranjeira deu flor
(e a água correndo pro mar)

(E a água correndo pro mar)
(E a água correndo pro mar)
(E a água correndo pro mar)
(E a água correndo pro mar)"

(Laranjeira, de Roquei Ferreira)

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Roberta Sá, a nova companheira das madrugadas..


Novo amor
Composição: Edu Krieger

A luz apaga porque já raiou o dia
E a fantasia vai voltar pro barracão
Outra ilusão desaparece quarta-feira
Queira ou não queira terminou o carnaval.

Mas não faz mal, não é o fim da batucada
E a madrugada vem trazer meu novo amor
Bate o tambor, chora a cuíca e o pandeiro
Come o couro no terreiro porque o choro começou.

A gente ri
A gente chora
E joga fora o que passou
A gente ri
A gente chora
E comemora o novo amor.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Vejam Bubble! Obriguem-se a ver Bubble! Um amor entre dois homens sofre as consequências da ignorância humana na guerra entre palestinos e israelenses. Tão sensível e tão tocante, Bubble ainda tem o humor sem exageros dos amigos com quem um deles divide o apartamento. Filme sobre tolerância e provas de amor, sobre o valor do outro, sobre a esperança de que as diferenças não sejam tão diferentes a ponto de separar. E depois de verem, baixem The man I love na voz de Ivri Lider e ouçam, ouçam, ouçam...

The Man I Love

Someday he'll come along, The man I love
And he'll be big and strong, The man I love
And when he comes my way
I'll do my best to make him stay
He'll look at me and smile, I'll understand
Then in a little while, He'll take my hand
And though it seems absurd
I know we both won't say a word

Maybe I shall meet him Sunday,
Maybe Monday, maybe not
Still I'm sure to meet him sunday
Maybe Tuesday will be my good news day

He'll build a little home, That's meant for two
From which I'll never roam, Who would, would you
And so all else above
I'm dreaming of the man I love


Bubble (Ha-Buah, de 2006)
De Eytan Fox
Elenco: Ohad Knoller, Yousef 'Joe' Sweid, Daniela Virtzer, Alon Friedman, Zohar Liba, Tzion Baruch, Oded Leopold, Roba Blal, Shredi Jabarin

sábado, 26 de janeiro de 2008


Carolina, de Chico Buarque

"Carolina
Nos seus olhos fundos
Guarda tanta dor
A dor de todo esse mundo
Eu já lhe expliquei que não vai dar
Seu pranto não vai nada mudar
Eu já convidei para dançar
É hora, já sei, de aproveitar
Lá fora, amor
Uma rosa nasceu
Todo mundo sambou
Uma estrela caiu
Eu bem que mostrei sorrindo
Pela janela, ói que lindo
Mas Carolina não viu

Carolina
Nos seus olhos tristes
Guarda tanto amor
O amor que já não existe
Eu bem que avisei, vai acabar
De tudo lhe dei para aceitar
Mil versos cantei pra lhe agradar
Agora não sei como explicar
Lá fora, amor
Uma rosa morreu
Uma festa acabou
Nosso barco partiu
Eu bem que mostrei a ela
O tempo passou na janela
Só Carolina não viu"

Será que o tempo tá passando e só eu não estou vendo? Por que tanta dor nesses olhos? Por que tanta dor? Por que é tão difícil fazer o novo? Por que o passado persegue tanto e a cabeça não deixa descansar? Ow, tantos porquês...






Caetano Veloso cantando "Carolina" no cd "Prenda Minha": http://www.youtube.com/watch?v=ijCwWsG_IBg

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

"Da rosa ficou um pouco."

Hoje estava meio angustiado sem saber porquê... Pressentimento ruim. Fiz esse blog há alguns dias mas ainda não havia postado. E o nome do blog é de um personagem do filme O segredo de Brokeback Mountain. Depois vi que seu intérprete, Heath Ledger, hoje, foi encontrado morto em seu apartamento. E também pensei em uma grande amiga que se foi... E também pensei em um ótimo tempo que se foi, me deixando uma dúvida se o hoje é bom ou ruim. E também me veio esse poema do Drummond, lembrando que sempre fica um pouco de qualquer coisa. Sempre fica...

RESÍDUO

De tudo ficou um pouco
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos. Da rosa
ficou um pouco.

Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).

Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato
se cobriu. Ficaram poucas
roupas, poucos véus rotos
pouco, pouco, muito pouco.

Mas de tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço
vazio de cigarros, ficou um pouco.

Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.

Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.

Se de tudo fica um pouco,
mas por que não ficaria
um pouco de mim? no trem
que leva ao norte, no barco,
nos anúncios de jornal,
um pouco de mim em Londres,
um pouco de mim algures?
na consoante?
no poço?

Um pouco fica oscilando
na embocadura dos rios
e os peixes não o evitam,
um pouco: não está nos livros.
De tudo fica um pouco.
Não muito: de uma torneira
pinga esta gota absurda,
meio sal e meio álcool,
salta esta perna de rã,
este vidro de relógio
partido em mil esperanças,
este pescoço de cisne,
este segredo infantil...
De tudo ficou um pouco:
de mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo na minha manga,
de tudo ficou um pouco;
vento nas orelhas minhas,
simplório arroto, gemido
de víscera inconformada,
e minúsculos artefatos:
campânula, alvéolo, cápsula
de revólver... de aspirina.
De tudo ficou um pouco.

E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.

Mas de tudo, terrível, fica um pouco,
e sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob os túneis
e sob as labaredas e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito
e sob o soluço, o cárcere, o esquecido
e sob os espetáculos e sob a morte escarlate
e sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e sob os gonzos da família e da classe,
fica sempre um pouco de tudo.
Às vezes um botão. Às vezes um rato.




Carlos Drummond de Andrade
In A Rosa do Povo
José Olympio, 1945
© Graña Drummond